Vinyl Maniac é um blog independente dedicado à cultura em suas formas mais atemporais — com foco especial em discos de vinil brasileiros, artistas esquecidos pela mídia, e resenhas autorais de música, literatura e cinema.
Aqui, a curadoria fala mais alto que o algoritmo.
Desde 2009, o blog oferece uma discografia comentada de LPs raros, compactos e relíquias sonoras, agora expandindo também para reflexões culturais, críticas de livros, filmes e movimentos artísticos.
Enquanto aguardamos a digitalização dos dois discos que faltam para o blog ficar 100% nesta área (Fats Elpidio e Os Copacabanas), vamos postar algo sobre K-Ximbinho. Gravações raras de suas composições.
A lista está abaixo, são discos muito antigos, 78 rpm em sua maioria, e a qualidade pode não ser a melhor possivel, mas poderemos claramente perceber a versatilidade deste extraordinário músico.
Aproveitem!
1 - Perplexo (K-Ximbinho) com K-Ximbinho e Seu Conjunto - Continental 16722, 1953
2 - Tudo Passa (K-Ximbinho) com K-Ximbinho e Seu Conjunto - Continental 16722, 1953
O segundo disco gravado por Auro Pedro Tomaz, o fabuloso Gaúcho, desta feita para a gravadora Rádio também merece alguns comentários.
A começar pelo time de craques que ele convocou: Zequinha Marinho (piano); Baden Powell (guitarra); Gabriel Bezerra (baixo); Dom Um Romão (bateria) e o mestre percussionista Luna. Gaúcho se apresenta com seu incomparável companheiro, um autêntico Dallape italiano.
Vale destacar que esta é a segunda aparição de Baden Powell em discos. A primeira, também em 1957, poucos meses antes desta gravação no segundo volume de A Turma da Gafieira. Mas a sua primeira composição gravada está aqui, o samba-canção Jóia, em parceria com o pianista Zequinha Marinho.
O disco todo é ótimo, com repertório primoroso e com Gaúcho brilhando muito mas dando espaço para seus extraordinários acompanhantes. Vale ressaltar, por último, seu choro Contratempo...o nome diz tudo, espetacular!
A boa regra da escrita pede que evitemos o uso desmedido de adjetivos e advérbios, mas com a Divina Música, como postou um leitor aqui outro dia, impossível não fazê-lo...
Curiosidade retirada da contra-capa que reproduzo na íntegra:
"Estas gravações foram feitas nos estúdios da Fábrica Rádio, utilizando microfones de condensador da marca Telefunken, tipo U-47, gravador de fita da marca Ampex modelo 350, amplificador de gravação em discos de Alta Fidelidade de 150 Watts marca Gotham e cabeças gravadoras de Alta Fidelidade "Grampian" com agulha aquecida."
Aproveitem!
1. Una Miradita e Nada Más
(H. Suarez)
2. Da Cor do Pecado
(Bororó)
3. Cansei
(Fortunato Benchimol)
4. Convite ao Samba
(Inaldo Vilarim / Gaúcho)
5. Jóia
(José Marinho / Baden Powell)
6. The Tender Trap
(J. V. Heusen / S. Cahn)
7. Pastorinhas
(Noel Rosa / João de Barro)
8. Ai Yoyô
(Henrique Vogeler)
9. Contratempo
(Gaúcho)
10. Quem Passa na Vida Sorrindo
(Fortunato Benchimol)
Um disco raro, lançado em tiragem limitada pelo selo americano Folkways Records, em 1956.
No folheto que acompanha o disco, ficamos sabendo, e apenas isto, que se trata de uma gravação feita com equipamento primário em Mar Grande, Itaparica, na Bahia, pelo antropólogo italiano, radicado nos USA, Carlo Castaldi. Cantada e executada por moradores locais, amadores portanto, revela algumas gratas surpresas.
Todas as faixas são consideradas "motivos populares", ou seja, canções que foram adquirindo notoriedade com o tempo, sem que lhes seja atribuida a autoria. É do povo.
E chamo logo a atenção para a faixa 2 do lado A: uma embolada surgida, pelas mãos e vozes astutas da dupla baiana Tom & Dito, a quem se atribui a autoria, como o tema de abertura da série da TV Globo "A Grande Familia" e que deve render um bom dinheiro a dupla...ora, como podemos observar, trata-se de um "motivo popular" já conhecido dos moradores de Mar Grande na década de 50, mas não tem dono mesmo...
Também é motivo para atenção a faixa 3, do mesmo lado, grafada no disco (as faixas não têm nomes) apenas como um tema em "rhythm of samba", e que é, na verdade, sem tirar nem por, a "macumba" Pena Verde, de J.B. de Carvalho, grande estudioso de ritmos afro-brasileiros. Estudou bem o nosso J.B. de Carvalho...
Mas o disco inteiro é curiosissímo contendo farto material para pesquisadores e estudiosos. Tem choros instrumentais sensacionais; marchas-rancho e, principalmente emboladas com letras muito engraçadas e maliciosas. Toda a sabedoria popular de músicos amadores baianos, recolhida durante séculos, vêm a tona neste "disquinho" fantástico.
A capa é do estilo "nada a ver" com o conteúdo (não sei de onde tiraram esta capa) mas os americanos têm um crédito enorme para com a MPB pois pagam tributo a um assunto raramente, para dizer nunca, tratado com seriedade por brasileiros. Ponto para eles então!
obs: lamento por alguns "pulos" e "clicks" em determinadas faixas (notadamente a 1 do lado A). Achei este disco num sebo em NY em estado deplorável, creio que o resultado obtido após processar com o SoundForge foi razoável. Vale a pena escutar. Quem tiver uma cópia melhor e quiser disponibilizar agradeço muito.
Sensacional disco solo de Chiquinho do Acordeon (Romeu Seibl), o primeiro para o selo Odeon.
Chiquinho do Acordeon possui vasta informação na internet (Google nele) principalmente por sua participação no legendário Trio Surdina, de fundamental importancia para a MPB instrumental.
Com produção de Aloysio de Oliveira, e, teóricamente, com o aval do orquestrador-mor da Odeon, o fabuloso Lyrio Pannicalli, Chiquinho desfia exuberante técnica no seu instrumento. Mas é para os seus arranjos, com todos os naipes tocados em surdina, que chamo a atenção dos meus eventuais leitores.
Imaginar que, confortavelmente deitado sobre o colchão das cordas, o disco nos remeterá ao que se convencionou chamar de "easy listening", de música fácil, ou, de elevador, nos fará incorrer em crasso engano.
Algumas observações contestáveis:
- Sucedeu assim - com maravilhoso arranjo a lindissima música de Marino Pinto, gravada anteriormente por Sylvia Telles, é tocada por Chiquinho e Sivuca (percebam os "vocalises") e, para mim, acompanhada pelo piano do próprio Tom Jobim embora não haja nenhum crédito no disco para ratificar minha afirmativa. Outra curiosidade é a semelhança com a música Ligia - composta muitos anos depois. Uma questão a se verificar , uma vez que Tom foi mestre em plagiar e auto-plagiar, nada, enfim, que diminua sua genialidade.
- Ho-ba-la-la - tudo o que João Gilberto gostaria de ouvir, tocada por orquestra, cordas e um instrumento solo, apenas um boleraço. Não há nada de bossanova nisto. Bossanova era a maneira que João dividia ritmicamente esta digna e respeitável música, tantas vezes inferiorizada e ridicularizada em função de sua letra. Atenção para os "lamentos" produzidos pelos saxes em algumas partes da canção.
- Se todos fossem iguais a voce - levada num andamento rápido, um samba-canção gravado como um sambão do Denis Brean, por exemplo, com arranjo à la Astor ou Nelsinho...curiosa e bonita!
- Estrada do sol - da mesma forma que a música acima, levada num andamento aparentemente "desconfortável" para ouvidos habituados a sua leveza e beleza. Grande arranjo de Chiquinho para as cordas e naipes de madeira e metal, mais uma vez os "lamentos" dos saxes aparecem, guarnecendo sua sensacional performance solo!
Existem muitas outras sutilezas neste discobelisco, descubram!
1. Tua
(G. Malgoni / B. Pallesi)
2. Sucedeu Assim
(Tom Jobim / Marino Pinto)
3. Hô-bá-lá-lá
(João Gilberto)
4. Se Todos Fossem Iguais a Você
(Tom Jobim / Vinicius de Moraes)