Uma historinha, ou uma estorinha...?
Era 1947. Inverno de 1947. O jovem maestro Severino Araújo não havia dormido bem a noite anterior à gravação. Amanheceu cansado mas a excitação agitava-lhe a mente. Ele não sabia que iria fazer História e nada detém a História. Mas que fato importante foi este que determinou uma profunda mudança nos rumos da nossa música? A resposta pode não ser óbvia para a maioria das pessoas, mas a gravação de Rhapsody in Blue, de George Gershwin, pela Orquestra Tabajara mudou tudo. Assim mesmo, curto e objetivo: nada foi como antes. O jazz já rondava literalmente a nossa praia desde 1944 durante o segundo "reinado" Getúlio Vargas. Cedemos importantes bases militares para os americanos no Nordeste em troca de polpudos empréstimos concedidos pelo presidente F.D. Roosevelt via Eximbank. Com isto fortaleceriamos nossa nascente indústria siderúrgica, receberíamos uma montanha de quinquilharias em troca e ainda ficaríamos com um patético dilema político-filosófico: lutávamos no exterior em prol da democracia enquanto aqui vivíamos sob feroz ditadura. Mas estamos tergiversando, o que nos interessa é saber que importantes bandas americanas e inglesas se apresentaram em Natal, Fortaleza, João Pessoa, Salvador e Recife. Bandas como as de Glenn Miller, Tommy Dorsey, Gene Krupa, a melosa orquestra de Melachrino e outras mais. Mas o que tudo isto tem a ver com a "nossa" história? Muito. O jazz deixara profunda impressão em nossos nordestinos músicos. Era um fenômeno mundial a expansão do jazz, mas ouvir aquelas orquestras famosas ao vivo, captando toda sua magia, foi mais que uma simples constatação a de que aquela arte extraordinária poderia ser "copiada", mas também podiamos mesclá-la ao nosso rítmo e transformá-la em algo novo e pulsante: o samba-jazz, se é que esta expressão é conveniente. Rhapsody in Blue em ritmo de samba, aqui começa nossa história. Aparentemente nada aconteceu, ou, ao menos, ninguém se deu conta de que esta música seria importante referencial para tudo o que viria depois em termos de música instrumental brasileira, (......)
Era 1956. A Turma da Gafieira, uma reunião de extraordinários músicos, Altamiro Carrilho, Raul de Souza, Edison Machado, Sivuca, Zequinha Marinho, Luiz Marinho, Zé Bodega e Cipó grava o antologico primeiro disco ( o segundo volume teria ainda o iniciante Baden Powell) que leva o mesmo nome do conjunto pela gravadora Musidisc...mas aí já é uma outra história...
Sobre o Blog:
A crítica especializada em música brasileira raramente escreveu ou escreve sobre os músicos que deram suporte à carreira dos nossos artistas, sob a alegada suposição de que ninguém se interessa pelo assunto. É de causar espanto que as próprias gravadoras, na maioria das vezes, também não dêem o devido crédito a esses profissionais na ficha técnica dos discos. Justamente aqueles que também foram autores de soberbos LP´s, a maioria jamais re-editados. Assim, justificadamente, grandes músicos e grandes discos sumiram no limbo da nossa brasileira memória.
Minha intenção é homenagear esses músicos extraordinários esquecidos pela mídia. Não entraremos no mérito da seguinte questão: se os discos apresentados são discos de jazz ou samba, ou qualquer outro tipo de abordagem do gênero. Meu interesse é apenas mostrar o talento de músicos que, ouso afirmar, tivessem nascido em qualquer outro país seriam considerados gênios e mereceriam o adequado tratamento, como fazem os americanos que cultuam seus velhos jazzistas. Desculpem a comparação: é inevitável.
Trata-se de trabalho mínimo, modesto, mas de alguma forma importante na medida em que se tenta resgatar pela absoluta ausência de informações, o trabalho de quem tanto fez para que nossa música fosse reconhecida como uma das melhores do mundo.
Ao iniciar este trabalho levei em consideração os músicos que contribuíram para a formação da moderna música brasileira, ou seja, o período que envolve meados dos anos 40 e as décadas de 50 e 60, passando pela bossa nova e pelo chamado samba jazz. Interessante e gratificante é perceber que alguns deles atravessaram dignamente todo o período acima citado e ainda hoje estão atuantes e em pleno vigor criativo e interpretativo.
Tentarei evitar, na medida do possível, mencionar músicos que são objeto de grande exposição e estudo como, por exemplo, Pixinguinha, Jacob do Bandolim, e tantos outros, a menos que algum disco mereça especial destaque. Pelo mesmo motivo e pelo exposto, informações sobre músicos e discos contemporâneos não serão objeto de abordagem neste blog.
Embora as fontes sejam citadas, nem todas as fotos são devidamente creditadas, portanto me deixe saber se você acredita que determinado fato apresentado violou alguma lei de direitos autorais, ele será removido imediatamente.
Finalmente, se existe algum músico não incluído no blog que você acredita merecer o devido reconhecimento, me faça saber e tentarei incluí-lo rapidamente. As ausências devem ser creditadas à falta de informação do autor e nunca ao desmerecimento, ao não reconhecimento de sua importância. Peço antecipadamente desculpas pelas injustificadas ausências.
Quero agradecer ao Sindicato dos Músicos Profissionais do Estado do Rio de Janeiro pelo apoio e valiosas informações; a Marcelo Einsenhower de Farias, pelas cópias em xerox de incontáveis capas e contra-capas de discos; a Joaquim Vivas, pelas biografias de Ed Lincoln e Walter Wanderley; e, Caetano Rodrigues, Niromar Fernandes e Sérgio Ximenes, amigos de todas as horas.
Eu não tenho praticamente nenhum crédito sobre a maioria dos fatos apresentados neste blog, apenas esparsos comentários sobre alguns discos, os links, o layout foram feitos por mim. Todas as informações foram colhidas nas contra-capas dos respectivos discos. Espero que voces façam bom proveito. Ah, comentários sempre serão motivadores. Obrigado!