domingo, 23 de agosto de 2009

Raul de Barros - O Máximo em Trombone



Com a preciosa ajuda do Sindicato dos Músicos do Rio de Janeiro e a pedido do Ministério da Cultura, em 2001, tive a oportunidade de falar com o mestre Raul. Em Maricá (RJ), onde residia com a sua companheira e, à época, invencíveis 87 anos, ele me contou uma história curiosa que prometi divulgar algum dia e talvez seja este o momento correto.
Lembram do famoso "noventa milhões em ação, pra frente Brasil do meu coração"? ufanista hino do Brasil na Copa do Mundo de 1970 cuja autoria seria do grande compositor Miguel Gustavo? Pois é, o velho Raul estava passando pelo Centro, no Rio, e encontrou um desolado Miguel Gustavo. Perguntado sobre o que ocorria, MG disse-lhe que os militares pediram que compusesse uma daquelas músicas que somente ele sabia fazer, que mexesse com a cabeça e a alma dos brasileiros - precisávamos ganhar a Copa, seria uma forma de amenizar o sentimento do povo com a dura realidade do regime vigente. Para os mais novos, e para quem não lembra, o filme homônimo Prá Frente Brasil, do Roberto Farias, dá uma boa idéia do que escrevo - todavia, sem qualquer inspiração, MG parecia nocauteado e o tempo urgia. A gravação estava marcada para dali a dois dias e nada da música, muito menos da letra...Raul então o acalmou e, mesmo afastado do inseparável trombone, "bochechou" a melodia para o MG que ficou simplesmente maravilhado com o que ouviu. A letra já lhe veio à cabeça imediatamente e, sentados no banco de uma praça, completaram a trilha sonora que seria um dos ícones do início dos anos 70, injustamente colocada ao lado de outras baboseiras do tipo - Eu te amo meu Brasil - de autoria da indefectível dupla Dom e Ravel - e quetais. Bem, o velho Raul saiu duplamente satisfeito; primeiro por ajudar o amigo, e depois porque aquilo era realmente uma beleza, não faria mal algum ganhar uns bons trocados, vislumbrada a quantidade de vezes que a marchinha seria tocada nas rádios. Ficou combinado que Raul participaria da gravação e que o cantor Miltinho seria o intérprete oficial. No dia da gravação, todos no estúdio, o produtor entrou e anunciou a gravação da música Prá frente Brasil, autoria de... Miguel Gustavo! Raul contou-me que gravou a música com lágrimas nos olhos, porém, como também é "o máximo" em matéria de coração, perdoou o amigo MG, mas, pensando bem, deixou de faturar uma aposentadoria digna pois aquela marcha seria tocada zilhões e zilhões de vezes nas rádios. Pronto mestre, demorou mas deixo aqui o registro.
Este disco é o Copacabana CLP 11299, de 1963, Raul com Orquestra Copacabana. Um pouco diferente dos discos habituais, repletos de choros e maxixes, com um repertório "morno", mesmo assim pode-se claramente perceber a categoria deste que foi um dos nossos maiores trombonistas, particularmente nas duas faixas de sua autoria.
Lado A
1 - Rêverie (Debussy)
2 - Voltarás (Raul - Murilo Latini)
3 - O lago da esperança (Cosme Teixeira - Ivonne Rabello)
4 - Tudo de bom prá voce (Raul)
5 - Ave Maria dos namorados (Jair Amorim - Evaldo Gouveia)
6 - Sabroso Cha Cha Cha (Juvenal Sampaio)
Lado B
1 - I´m gettin sentimental over you (Washington - Bassman)
2 - Judeu errante (Ayres Viana - Edel Ney)
3 - Ingratidão (José Araújo - Mineirinho)
4 - Voce quis...e levou (Almeida Rêgo - Gilda de Barros)
5 - Entardecer (Oscar Bellandi - Paulo Gesta)
6 - Requebra baiana (Rocha Filho)


http://www.mediafire.com/?bczn5hobggpbuv7




Para ouvir agora:


4 comentários:

Louro disse...

Olá, a música "Prá Frente Brasil", como você mesmo relata foi encomendada pelo regime militar para aproveitar a onda do tricampeonato, entretanto, a outra "Eu Te Amo Meu Brasil", que você também citou como "baboseira" da "indefectível" dupla Dom & Ravel, embora também ufanista, não foi encomendada e revela um amor ingênuo pelo país. A dupla Dom & Ravel foi injustamente execrada como bajuladora da ditadura, mas não é verdade, ela, inclusive, foi censurada por essa mesma ditadura. Sugiro para melhor conhecimento dessa parte da história que leia o livro "Eu Não Sou Cachorro Não" do escritor Paulo César de Araújo.
Louriva Augusto

Vinyl Maniac disse...

Caro Lourival,
obrigado pelo belo comentário. Prossigamos pois: gravar o "Hino do Mobral" teria sido, também, uma iniciativa da dupla? "Só o amor constrói", idem? Não sejamos ingênuos a este ponto! Se voce se refere (certamente) a composição "censurada" Animais Irracionais eu terei certeza de que estamos falando de coisas absolutamente iguais...
E, olhe voce, nem citei a nossa conterrânea dupla Tom & Dito...
Um axé para voce!

Francisco Ortiz Archila disse...

Hoy descubrí este buen blog, muchas gracias, saludos.

Vinyl Maniac disse...

muchas gracias Francisco! saludos desde Brasil

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